Setembro Amarelo: especialistas em educação listam temas relacionados à saúde mental que exigem atenção

O dia 10 de setembro marca a celebração do Dia Mundial de Prevenção do Suicídio, porém, por conta da notoriedade da data e de sua visibilidade, a efeméride acabou se estendo para todo o mês. E, assim, a importância dos cuidados com a saúde mental para a prevenção do suicídio ganha espaço na pauta.

Em se tratando de educação, existe uma série de pontos que merecem atenção e podem afetar tanto a saúde mental dos estudantes quanto a dos educadores. Para melhor compreender a questão e, mais do que isso, prevenir e manter a saúde mental em equilíbrio, especialistas trazem dicas e reflexões sobre o assunto.

Construindo pontes de apoio na campanha do Setembro Amarelo
O Setembro Amarelo é um momento chave para a conscientização sobre a importância de prevenir o suicídio e suscita a importância do diálogo aberto e da empatia, considerados fatores essenciais para identificar e apoiar as pessoas que estão passando por momentos difíceis. Muitas vezes, é crucial entender que o suicídio está relacionado a problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade, que podem e devem ser tratados.

Segundo o médico psiquiatra Celso Lopes de Souza, fundador do Programa Semente, as abordagens efetivamente sábias são aquelas que levam uma aprendizagem das emoções para a escola. Reconhecer os próprios sentimentos e a importância deles ajuda muito na prevenção e aumenta a capacidade de pedir ajuda. Cerca de 90% das pessoas que evoluem para suicídio ou até para tentativa tinham algum transtorno psiquiátrico, por isso que existe a necessidade de reconhecer quando existe algo errado e de conseguir pedir ajuda. “Se a pessoa se sente com os famosos 3 ‘is’: insuportável, impossível e interminável, é muito importante procurar ajuda e entender que isso não acontece da noite para o dia”, comenta o psiquiatra.

Equilíbrio da saúde mental no vestibular
Em tempos de vestibular, é essencial manter o equilíbrio da saúde mental. Para tanto, o diretor de ensino do Colégio Master (Fortaleza/CE), Fabrício Pires, afirma ser muito importante manter uma rotina de estudos e “recarregar as baterias”, principalmente na reta final. “Não desanime, falta pouco! Continue com a mesma rotina adotada ao longo do ano, assistindo às aulas, revendo questões e mantendo o ritmo no período extraclasse”, destaca. “Além disso, não deixe de lado os seus momentos de relaxamento e de descontração. O descanso também é importante para a melhoria de desempenho e de rendimento, uma vez que uma mente cansada não absorve tão bem os conteúdos. Inclua intervalos de 30 minutos a cada duas horas e meia de estudos” explica o diretor.

Segundo Pires, outro fator importante é buscar suporte em familiares e amigos. Nesse momento, é essencial estar perto das pessoas que mais ama. O cansaço é muito comum com a aproximação do fim do ano, ainda mais com tamanha preparação. Por isso, esse apoio emocional se faz importante para manter a energia, a motivação e a saúde mental do estudante. Tudo isso auxilia na fixação dos conteúdos e melhora o desempenho na prova.

Educadores em foco
Pesquisa realizada pela Nova Escola, em parceria com o Instituto Ame Sua Mente, aponta que um dos grupos que vem sendo mais afetados pela falta de suporte para saúde mental é o dos educadores. Dados mostram que mais de 20% dos educadores brasileiros consideram sua saúde mental ruim ou muito ruim. A partir deste cenário, Juliana Storniolo, diretora da FourC Learning, projeto voltado para qualificação de gestores e educadores, fala sobre a importância de oferecer cuidados psicológicos aos profissionais da educação.

“Os profissionais da educação precisam receber cuidados voltados para a saúde mental a fim de que eles estejam preparados para lidar com os desafios diários da profissão. Nessa cultura de apoio, tão necessária, o suporte dos gestores a partir de um canal de comunicação aberto é fundamental”, explica Juliana. Para ela, um dos papéis da liderança é acompanhar e direcionar esses profissionais para identificar questões de ordem psicológica, sempre que necessário, oferecendo, inclusive, suporte emocional para criar um ambiente de trabalho que promova bem-estar, autoconhecimento e prática de atividades de relaxamento”, acrescenta a diretora.

Trabalhando conflitos e diferenças em sala de aula
Promover um diálogo saudável entre o educador mediador e as partes envolvidas é fundamental para resolver conflitos, de modo construtivo, no contexto escolar. Esse diálogo possibilita a expressão de sentimentos, de opiniões e de perspectivas, aprofundando a compreensão das raízes do conflito. “Ao agir como facilitador, o educador auxilia na melhoria das habilidades de comunicação e empatia dos envolvidos. Esse ambiente de diálogo seguro estimula a expressão e compreensão das emoções, resultando em soluções colaborativas e relações interpessoais fortalecidas”, explica o CEO da Vereda Educação, Arthur Buzzato.

Reconhecer e valorizar as singularidades de cada aluno é fundamental para criar um ambiente escolar inclusivo e enriquecedor. Para Buzzato, cada estudante traz consigo experiências, perspectivas e habilidades únicas, e, ao respeitar essas diferenças, a escola cultiva aceitação e respeito mútuo.

“Essa valorização promove não apenas a compreensão das diversas culturas, interesses e habilidades dos colegas, mas também o desenvolvimento da empatia. Competências socioemocionais, como a cooperação, o autoconhecimento e a comunicação eficaz desempenham um papel crucial na resolução de conflitos e na promoção de um ambiente harmonioso”, complementa o CEO da Vereda Educação. Ao dominar essas habilidades, os alunos se tornam capazes de compreender e expressar emoções, comunicar necessidades construtivamente e colaborar de forma eficaz para alcançar objetivos comuns, criando uma resolução harmoniosa e profunda.

Conscientização e prevenção de bullying nas escolas
Investir em conscientização e prevenção do bullying nas escolas é fundamental para criar um ambiente acolhedor, colaborativo e responsivo. Por meio do desenvolvimento de habilidades sociais, resolução de conflitos e empatia, os alunos são preparados não apenas para o sucesso acadêmico, mas também para uma vida saudável. A orientadora Silvia Regina Dias, do Colégio Anglo Alante São José dos Campos, do Grupo Salta, destaca a importância de uma abordagem mediadora, na qual os casos de bullying são investigados minuciosamente e ações apropriadas são tomadas para cada situação, incluindo projetos que deixam claro a intolerância a comportamentos prejudiciais.

A professora do Ensino Fundamental Anos Finais, Camila Pascui, do Laboratório Inteligência de Vida (LIV) do Colégio Anglo Alante São José dos Campos, enfatiza que a escola frequentemente é o único porto seguro para muitos alunos, tornando crucial a promoção de um ambiente saudável. Isso não somente aprimora o processo de ensino-aprendizagem, mas também constrói confiança, permitindo que os alunos busquem ajuda em momentos de necessidade.

Como cuidar da saúde mental na fase dos vestibulares?
O Setembro Amarelo é uma campanha de conscientização para a prevenção do suicídio, compartilhando informações que auxiliam a preservar a saúde mental, como a identificação de situações de riscos para si e para os demais, além de fomentar reflexões sobre formas disponíveis de cuidados. Essa prevenção deve acontecer durante o ano inteiro, mas aproveitando o mês da divulgação e a aproximação dos vestibulares, os jovens devem tirar um momento da agenda para avaliar, com mais ênfase, como estão se cuidando. Caso contrário, o momento de extrema pressão nos estudos pode despertar ou intensificar questões de saúde mental pré-existentes.

“Podemos ficar atentos a: intensidade, frequência, duração e mudança de comportamento, aparentemente justificados ou não. Principalmente ter atenção se esses fatores aparecem juntos. Alguns exemplos como mudanças no sono, na concentração ou no humor que são intensas e duradouras e podem comprometer a saúde se perdurarem. Existe diferença em oscilações que ocorrem em situações pontuais, claro”, diz a psicóloga do Serviço de Atendimento Psicológico (SAP) do Curso Anglo, Samara Nabuco.

Cultura escolar de alta confiança
Previsto na Base Nacional Comum Curricular (BNCC), trabalhar as habilidades socioemocionais das crianças desde a primeira infância é garantir seus direitos de aprendizagem e de conhecimento. Por isso, iniciativas que contemplam essas competências contribuem para a formação e para o desenvolvimento das novas gerações, o que implica em compreender a complexidade desse desenvolvimento, rompendo com visões reducionistas do ser.

Heleomar Gonçalves, assessor pedagógico do programa Líder em Mim, proposta pedagógica que visa a formação de líderes desde cedo, diz que, para alcançar um viés pedagógico de acolhimento e de reconhecimento pleno dos alunos, a educação deve garantir que eles desenvolvam competências como:

  1. Conhecer-se, apreciar-se e cuidar de sua saúde física e emocional, compreendendo-se na diversidade humana e reconhecendo suas emoções e as dos outros, com autocrítica e capacidade para lidar com elas;
  2. Exercitar a empatia, o diálogo, a resolução de conflitos e a cooperação, fazendo-se respeitar e promovendo o respeito ao outro e aos direitos humanos, com acolhimento e valorização da diversidade de indivíduos e de grupos sociais, seus saberes, identidades, culturas e potencialidades, sem preconceitos de qualquer natureza;
  3. Agir pessoal e coletivamente com autonomia, responsabilidade, flexibilidade, resiliência e determinação, tomando decisões com base em princípios éticos, democráticos, inclusivos, sustentáveis e solidários.

Além disso, a gerente das Soluções Complementares da Somos Educação, Luciana Patrocínio, conta que programas socioemocionais como o Líder em Mim focam em práticas que tragam, o ano todo, a importância do autocuidado presente em movimentos como o Setembro Amarelo. “O programa [Líder em Mim] é estruturado para que a escola desenvolva ações práticas que contribuam para o contexto do momento. Então, as escolas já puxam ações e práticas de autocuidado como a conta bancária emocional que contribuem para isso”, explica.

Disciplina Positiva ajuda crianças nas habilidades socioemocionais
Dentro do contexto do Setembro Amarelo, também surgem questões como a necessidade de combater a violência dentro da escola. Violência essa que pode se manifestar pelo bullying ou pelo cyberbullying, por exemplo. Instituições de ensino podem e devem pensar em ações e práticas perenes para melhorar a saúde mental das crianças e dos adolescentes. Na Red Balloon, escola especializada no ensino de inglês, a disciplina positiva é aplicada por todo o corpo docente a fim de conhecer melhor cada aluno, em sua individualidade e, assim, colaborar com o desenvolvimento de habilidades, competências e criatividade.

A disciplina positiva tem relação direta com o desenvolvimento socioemocional e, consequentemente, com o controle das emoções. Baseada na firmeza e na gentileza, sem punição, castigo ou recompensa, a abordagem estimula o desenvolvimento do autoconhecimento e do autocontrole, além de habilidades sociais importantes, como a empatia e a autoconfiança. “A disciplina positiva ensina importantes habilidades sociais e de vida de maneira profundamente respeitosa e encorajadora, partindo do conceito de conexão antes da correção, incentivando o pertencimento e o encorajamento”, explica a gerente pedagógica da Red Balloon, Claudia Peruccini,

Guia de saúde mental para estudantes
Para apoiar as equipes escolares no acolhimento adequado aos alunos que enfrentam dificuldades emocionais, a Camino School desenvolveu um guia inédito e gratuito de saúde mental. O material, disponível on-line, traz informações, diretrizes e protocolos para casos de agressão física, violência, luto, depressão e ansiedade, orientando as escolas nos procedimentos adequados. “Cada caso é único e pode exigir abordagens específicas, mas é fundamental implementar um fluxo geral de endereçamento de crises escolares que seja capaz de garantir uma resposta rápida, coordenada e eficaz”, explica a autora e coordenadora geral do material desenvolvido pela Camino School, Renata Trefiglio.

“Identificar a crise, saber como intervir, avaliar o caso e garantir a segurança de todas as pessoas da escola são passos explicados no handbook, os quais precisam estar bem delineados nos protocolos da instituição de ensino, para que o ambiente escolar seja um espaço que prioriza o bem-estar emocional dos estudantes”, afirma Renata. Visando reforçar a importância da prevenção e da promoção da saúde mental no ambiente escolar, o material traz, ainda, estratégias para fortalecer a resiliência dos alunos, criar uma cultura de apoio mútuo e desenvolver programas de bem-estar emocional que possam ser incorporados à rotina escolar. Para baixar gratuitamente o handbook, basta acessar este link.